O artigo entitulado Mães de Autistas – Como manter a sanidade física e mental deu o que falar nas redes sociais.
Nem todas as mães parecem encontrar tempo para si mesmas. No autismo 24×7 (o dia todo, a semana inteira) fica difícil ler meu artigo e pensar: “Ah tá, vou fazer o que a Fatima de Kwant me indicou.” Acreditem, I know, I’ve been there, done that, seen it, felt it. Eu estava na Holanda, sem família e com parentes do meu marido que tinham vidas muito corridas, sem poder dar ajuda. Minhas amizades eram contadas nos dedos. País distante do meu, barreira do idioma e autismo 24×7: Mega Desafio.
Foi só quando eu descobri uma depressão (ansiedade, taquicardia e queda radical de peso) é que abri os olhos: eu não era invulnerável.
Comecei contando com a ajuda (paga) de baby sitters diaristas – comum na Europa. Claro que não era qualquer uma pessoa. Eu escolhia somente as moças com boa recomendação. Fosse para uma saída descontraída com meu marido, ou um cinema com minhas filhas neurotípicas; sair para correr, ou dar um pulo no shopping, eu ia sem culpa e com certeza que era bom para mim e para o Edinho (a babá era uma pessoa diferente, que falava coisas diferentes = um desafio para a zona de conforto do meu filho).
Mais tarde, eu e meu marido chegamos à conclusão que ter uma babá/empregada fixa era mais barato e foi o que fizemos. Eu continuei a ser mãe integral, e até mais que isso: estudei para ser sua terapeuta, também.
Nós, mulheres mães de autistas (ou crianças diferentes) nos boicotamos o tempo todo. Todo mundo a nosso redor sente pena, dá palpite, diz que “somos escolhidas por Deus” e tudo mais, mas não nos dão o que mais precisamos: ajuda prática. Queremos alguém que apareça nos momentos em que estamos explodindo pela tampa. Não para dizer: “Força, amiga. Deus só dá a cruz que podemos carregar…”, mas para dizer: “Aí, amiga. Deixa o Edinho comigo e vai hoje pro Spa/shopping/academia/fds com o maridão, etc.
Precisamos parar de ter vergonha de pedir, ou escolher pagar por alguma assistência. Amiga de verdade, ajuda. Uma das minhas melhores amigas não tem filhos autistas e foi uma das pessoas a cuidar do Edinho quando eu precisei muito. Talvez outras tb o fizessem, mas eu não pedi. Não pedi porque achei que era um problema meu, ou tinha medo de deixá-lo com outros. Hoje eu sei como é bom deixar nossa criança autista com outras pessoas de confiança:
– eles se deparam com novas experiências
– eles comem alimentos que não comem em casa
– eles fazem um esforço (desafiam seus neurônios) para enteder outras pessoas
– eles podem dormir melhor
– eles podem aprender alguma coisa que a gente nunca pensou em ensinar.
Precisamos parar de ter medo de pedir alguma coisa a alguém; de sentir culpa de sair sem nossa criança autista; vergonha por ousar pensar em outra coisa que não seja o autismo.
Pergunta para refletir:
VOCÊ VIVE A VIDA OU É VIVIDA POR ELA?
A resposta é simples: se você faz o que gosta, a maior parte do tempo, você vive; se você faz o que não gosta (ou não te dá prazer) a maior parte do tempo, você é vivida pela vida.
O curioso é que tudo isso foi uma escolha nossa. O autismo, não; o autismo aconteceu. Mas a opção de ser mãe foi nossa (em geral a mulher consciente escolhe engravidar). Escolha ser feliz apesar de qualquer problema.
Problemas não são obstáculos; são situações que estão esperando ser resolvidas.
Quantos papéis somos capazes de assumir na vida?
Mulher, mãe, filha, amiga, profissional. Cada pessoa e situação espera algo de nós. O que escolhemos ser a maior parte do tempo? Para quem? Por quê? Vale a pena? O que vale a pena? Como você quer viver? O que você pode fazer por isso? Que preço vai pagar (tempo, energia, rejeição, dor, desconforto)?
Quem disse que você precisa ter dez amigas que só valem para curtir seu Instagram ao invés de investir em três que estarão do seu lado para sempre (inclusive para tomar conta do seu filho autista)?
Quem disse que você precisa trabalhar dois empregos para pagar as terapias do seu filho, se você pode ficar em casa e ser a terapeuta do seu filho (você, o melhor brinquedo que seu filho quer)?
Quem disse que você precisa ir a todas as festas, todos os eventos onde seus amigos circulam, se seu pensamento está voltado para a sua família e ficar em casa num fim de semana pode ser super reconfortante para todos?
Quem disse que você não pode pagar por uma pessoa de confiança e ótimo caráter (uma das suas amigas?) para ficar algumas horas com seu filho enquanto você faz algo do que gosta muito e que te distrai tanto que você “esquece” que é mãe de uma criança que te traz desafios?
Não coloque empecilhos para alcançar o que é bom para você. Não se boicote. Por trás da mulher maravilha, mãe, dona-de-casa, profissional, filha, esposa, tem uma menina que nunca deve crescer para descobrir que o corpo dela está sendo carregado para lá e para cá para fazer o que ela não gosta. Procure esta menina. Fale com ela. Ouça o que ela tem a dizer. Relembre seus sonhos. Faça um plano para consegui-los. Desmembre cada dificuldade até resolvé-la.
Enfrente o medo e o resultado vai ser a vida que você quer viver, fisica e mentalmente sã.
Muito amor para você ❤️
Fatima
*Fatima de Kwant reside na Holanda desde 1985, é jornalista, mãe de um rapaz autista adulto e também Especialista em Autismo pelo Conselho Nacional de Especialistas em Autismo dos Países Baixos.
Escrito em 02 de outubro de 2017
Fonte: www.autimates.com/mae-de-autista-vida-que-voce-vive-x-vida-que-vive-voce